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Minidocumentário "O Pelotão de Voluntários das Cerejeiras, 1953-1955" (2023)
MI na Pesquisa
O Museu da Imigração busca manter o seu público atualizado sobre as novas descobertas e perspectivas que surgem em torno da temática migratória. A transversalidade do tema e a constante mudança conceitual sugerida pelas novas conjunturas migratórias faz com que seja necessário ao Museu o desenvolvimento de um trabalho em rede, conectado com outros agentes e saberes. A partir desse modo de trabalho, o Blog do CPPR tem se colocado, nos últimos anos, a serviço de um debate mais amplo e público, privilegiando a divulgação científica.
Assim, nessa publicação, o pesquisador Gustavo T. Taniguchi apresenta o minidocumentário O Pelotão de Voluntários das Cerejeiras, 1953-1955 (2023), resultado da sua pesquisa realizada sobre o Sakuragumi Teishintai, grupo de nacionalistas japoneses atuantes em São Paulo no pós II Guerra Mundial.
Clique aqui e assista ao minidocumentário O Pelotão de Voluntários das Cerejeiras, 1953-1955 (2023)
Conflitos, nacionalismos e repatriamento de japoneses em São Paulo após o término da II Guerra Mundial
Por Gustavo T. Taniguti
O estado de São Paulo abrigou a maior parcela dos imigrantes japoneses que aportaram em nosso país entre 1908 até meados dos anos 1970. Isso se deveu principalmente ao interesse na contratação dessa mão de obra e às oportunidades econômicas existentes no estado, fortemente ligadas à expansão agrícola. Como resultado, hoje o Brasil possui a maior comunidade de descendentes de japoneses nascidos fora do Japão, com cerca de 1,5 milhão de pessoas.
É importante ressaltar que essa jornada migratória, realizada ao longo do século vinte, nem sempre foi pacífica e não esteve livre de situações de tensão e conflito. A história nos mostra que a trajetória dos imigrantes japoneses foi permeada por acontecimentos marcantes, ocorridos em uma época de grandes transformações sociais, políticas e econômicas. Exemplo disso foi o surgimento, logo após o término da II Guerra Mundial, de grupos nacionalistas japoneses que se recusaram a aceitar a rendição de sua nação no conflito bélico.
Na bibliografia especializada, a história de grupos como a Shindo-Renmei, surgida no interior do estado de São Paulo, já foi discutida por um número considerável de autores. Outras histórias, que envolvem principalmente tentativas de repatriamento nos anos 1950, ainda aguardam maior atenção.
O minidocumentário O Pelotão de Voluntários das Cerejeiras, 1953-1955 (2023), produzido por Gustavo Taniguti, é uma oportunidade de conhecer o caso do grupo Sakuragumi Teishintai. Este grupo, autodenominado paramilitar e de forte apelo nacionalista, chegou a reunir cerca de 300 integrantes e esteve envolvido em acontecimentos de grande repercussão entre 1953 e 1955 em São Paulo.
Com a assinatura do Tratado de São Francisco e a retomada da imigração japonesa para o Brasil (1952), imigrantes japoneses insatisfeitos vislumbraram a chance de regressar ao Japão. Contudo, muitos não possuíam recursos suficientes para tal e acabaram atraídos por falsas promessas de retorno.
Devido às suspeitas estelionato e aos episódios de conflito com o Consulado Geral do Japão em São Paulo, o Sakuragumi Teishintai foi reprimido com violência pelas forças policiais e seus membros foram por meses confinados em uma hospedaria. Devido ao abuso de força policial, o caso foi encaminhado a uma comissão especial da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo.
O caso se encerrou no fim de 1955, as suas lideranças foram detidas e as diversas famílias que vislumbravam retornar ao Japão se dispersaram. Trata-se, possivelmente, de um dos últimos episódios explicitamente conflituosos envolvendo japoneses e sociedade paulista pois, a partir de 1958, as narrativas sobre a presença japonesa no Brasil assumiriam novas feições, mais positivas e celebratórias.
Na imprensa, o caso foi interpretado como associado ao fanatismo nipônico do pós-guerra. Reportagens apelidaram a chácara onde esse grupo se reunia de "Canudos em miniatura". O minidocumentário busca contar essa história a partir de registros documentais, destacando o processo de construção de diferenças étnico-raciais envolvendo grupos de origens sociais distintas na sociedade brasileira.
Por ser o principal grupo nacional do Leste Asiático que emigrou para o Brasil no período considerado, os japoneses vivenciaram as consequências da exclusão, do racismo e da xenofobia – intensificados durante o regime ditatorial do Estado Novo (1937-1945) e durante a II Guerra Mundial. Já em fins dos anos 1950, observou-se uma melhor aceitação da presença japonesa no Brasil.
A história da Sakuragumi Teishintai é contada aqui por meio de uma linguagem simples e direta, com o intuito de estimular o interesse do público na mudança de fronteiras simbólicas, presentes na relação nacional-estrangeiro no Brasil.
Gustavo Taniguti é sociólogo e pesquisador. Possui doutorado em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP) e realizou pesquisa pós-doutoral na mesma instituição com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Atuou como pesquisador visitante na Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, e na École des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS), na França. É autor do livro Imigração, política e cultura: a trajetória empresarial da Cooperativa Agrícola de Cotia (2019). Foi editor regional da revista Global Dialogue, publicada pela International Sociological Association (ISA) entre 2011 e 2023. Seus temas de pesquisa incluem sociologia do trabalho, educação, sociologia econômica, migrações, imigração japonesa no Brasil e história das ciências sociais brasileiras.
Crédito foto da chamada: Acervo Pessoal Gustavo Taniguti.
Os artigos publicados na seção Migrações em Debate não traduzem necessariamente a opinião do Museu da Imigração do Estado de São Paulo. A disponibilização de textos autorais faz parte do nosso comprometimento com a abertura ao debate e à construção de diálogos referentes ao fenômeno migratório no passado e na contemporaneidade.